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dois poemas

por jessica stori


a mosca dá uns perdido
eu pergunto


cadê a praia?
entre nós
foi o que ele disse
apontando o dedo
sem precisar descer 
da sua cadeira 
madeira rústica e podre
cadê o esquema?
não somos ricos e complicados
vem de maionese
foi o que ele disse
em condição torta
há mais de vinte dias
eu prometo 
vou carregar esse botijão
até ele explodir em algum 
lugar celeste
de falsa apreciação
a beleza da mosca sendo deus
aqueles olhos que tudo veem
aquelas asas que tudo alcançam
minha mãe diria
misericórdia
tá amarrado 
caiu no uso do mundo
assim como tomo posse
foi livramento
é o que eu falo
assumindo pra mim
essa história que 
também é minha
o que ela pode me dar
de cheiro azedo
de sorriso estranho
como já falaram
boo & stitch nela
é o que eu sou
é como o mundo me vê
um sorriso desorientado
esperando o pouso de deus 
na nuca ou no pé
esperando o acerto do tapa
esse que nunca chega
que pega em cheio
sem raquete elétrica
que mata de boca aberta
não transcende


veio pelo micro-ondas

ela disse
faz pra você uma ilha

amanhã ela chegou
com caixa e tudo

20 pila no embrulho

abri e tava lá
a ilha pronta 
com trilha e 
passeio de barco

coloquei na geladeira
de um dia pro outro pedra

a ilha quebrada
gelei na coca-cola

com o petróleo no estômago
chamei papai

carreguei e limpei
hoje ele continua na merda

o que ainda enlaça
o que ainda berra

desvendei a sobrevivência 
espiando a armadilha
engenhoca livre

parida na interrupção
a armadilha garante a fuga
eu ouvi correr

foi como eu digeri



jessica stori é escritora e historiadora. tem 25 anos e vive em Curitiba. é graduada e mestra em História. suas áreas de pesquisa são a crítica literária feminista, o pensamento decolonial e a memória. integra a Membrana Literária, grupa crítica-afetiva de escritoras/es. seu primeiro livro, Carne e colapso, foi lançado pela Editora Urutau em maio de 2020.